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Olá, leitor, leitora

Se você gosta de ler, chegou o momento para conhecer as nossas histórias! Leia o primeiro capítulo dos livros da Ler Amar!

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Degustação
de
Halloween 

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Monte Conver

Degustação de Hallowen

Capítulo I

Naquela noite, tudo estava quieto, a não ser pelo som das trovoadas rasgando o silêncio de uma mente desesperada em agonias. Uma pobre alma estava ajoelhada. De seus olhos jorravam lágrimas, que caíam com a chuva, molhando o chão de terra que servia de cobertor para corpos sem vida, os quais os espíritos continuavam vagando sem
rumo por túmulos já esquecidos pelo tempo.

 

A única vontade de Julia, que se lamentava, era de querer trazer paz para o coração da sua família, mas essa busca só trouxe desgraça para a vida das pessoas que ela mais amava.
 

— Meu coração está em chamas de angústia e amargura. Nem meu querido Poe com seus poemas melancólicos conseguiria descrever a dor que estou sentindo neste momento. Peço a Deus que olhe por mim e tenha compaixão desta minha alma consumida por um mal antigo e, por obra de um destino cruel, me aprisiona por mãos firmes e sem piedade. Sinto ele dentro de mim lutando a todo tempo para ter o controle. A sede dele por sangue e a fome de almas embrulha meu estômago — disse Julia.

Seus olhos se encheram com um grande clarão do relâmpago iluminando a escuridão do cemitério, "mas aquilo não foi suficiente para trazer luz para ela", pensou Julia, que estava viva fisicamente, porém, por dentro, se sentia tão morta quanto as pessoas debaixo da terra.

Seu direito de ter paz foi triturado por um mal que apenas começou o seu reinado.

E, agora, ela só tinha as recordações daquela semana, do início do seu tormento.

~

João havia saído da rodovia principal e entrado em uma estrada mais isolada que dava acesso ao Monte Conver. Tinha algo em seus olhos que fazia sua alma voar como um pássaro; ele estava tão animado com essa viagem que nem aquela estrada totalmente deserta e com grandes árvores ao seu redor a tornou monótona. Mas, por um instante, um pensamento se formou em sua mente trazendo uma certa estranheza.


Ele e Susan sempre viajaram e os dois gostavam de fazer trilhas, porém, nem um e nem o outro ouviram falar desses chalés. Quando Julia mostrou aquele folheto, ambos ficaram surpresos por nunca terem ouvido. Ainda mais quando viram as fotos. Era um lugar muito bonito para passar despercebido.

 

Quando ligou para lá, suas esperanças de que o lugar estivesse funcionando foram para zero, porque a ligação só chamou. Então resolveu ir até lá para ver se era verdade mesmo, pois precisava que estivessem funcionando. Todos conseguiram folgas para aquele final de semana, e estava tão em cima que não tinham muitas opções. Eles já idealizavam algo bem especial naquele lugar.

 

João avistou uma placa de madeira escondida, uma árvore a encobria com seus galhos, que dizia “Chalés, Monte Conver”. Diminuiu a velocidade, entrou no caminho e subiu uma estrada de terra por uns trinta minutos quando avistou outro letreiro enorme escrito: “SEJA BEM-VINDO AO CHALÉ MONTE CONVER”.

 

Ele procurou o estacionamento. Ao ver uma picape vermelha estacionada, parou o carro ao lado dela e saiu; antes, ele encostou na lateral do carro, tirando do bolso um cigarro, acendeu-o e ficou ali admirando a paisagem exuberante. O lugar era lindo, seus ouvidos estavam encantados com a melodia dos pássaros. À frente do estacionamento, percebeu uma trilha que dava acesso à floresta e leu uma placa: “Cachoeiras a 15 m”. Logo atrás dele, contou seis chalés, um do lado do outro, e começou a caminhar para poder vê-los melhor. "São maiores do que o normal", pensou.

 

Todos os chalés pareciam ter um padrão, feitos de madeiras com uma pequena varanda na entrada, um banco de balanço e um canteiro de rosas brancas. Havia duas grandes janelas acima dessas roseiras. Cada chalé tinha uma trilha de pedras que se encontravam, formando uma única trilha que levava à recepção. Lá foi onde avistou uma pequena escadaria. As cores da recepção pareciam ter sido pintadas recentemente, e sua cor salmão combinava perfeitamente com o lugar. Também havia duas grandes portas de vidro.

 

João voltou para o carro e terminou de fumar seu cigarro, colocou a bituca em um copo de café que tomou mais cedo. Então, bateu a porta do carro e saiu em direção à recepção. Uma sensação passou pelo seu corpo, fazendo-o se estremecer. E, novamente, pensou que ainda tinha algo estranho naquele lugar, mas não sabia o que era.

Quando chegou nas portas de vidro, olhou para baixo e viu um tapete escrito: SEJA BEM-VINDO AOS CHALÉS MONTE CONVER.

Dentro, viu duas mulheres.
 

— Bom, pelo menos parece que está funcionando — disse ele, empurrando a porta.
 

Então entrou e foi direto para a recepção.
 

— Bom dia! — falou, dando um sorriso para a mulher que estava no balcão, ela aparentava ter seus vinte e cinco anos, enquanto a outra aparentava ser bem mais nova.

Uma das mulheres estava arrumando umas revistas em uma mesa de centro e tomou um susto, mas logo ficou sem graça quando viu João olhando para ela e sorrindo.


— Oi, bom dia! — disse a outra mulher que estava atrás do balcão. — Seja bem-vindo aos chalés Monte Conver. Eu sou a Cloe, e essa é a minha irmã Vivian.

 

João viu Vivian indo para o lado da irmã, ainda sem graça, então sorriu para as duas, encostou os braços no balcão e disse:

 

— Olá, sou o João e gostaria de reservar dois chalés para essa sexta, por favor. E quero dizer que esse lugar é fantástico!
 

Cloe sorriu para ele.

 

— Você não viu nada — respondeu ela e apontou para uma janela ao lado do balcão. — Está vendo aquela trilha? Ela leva às cachoeiras, mas, se você tiver fôlego e continuar, vai dar acesso à montanha Monte Conver e lá é um lugar que, para mim, é mágico. Você vai ter a vista da cidade toda de Embar e da cidade de Red Blair, um lugar lindo de dia e perfeito de noite com as luzes da cidade.

Vivian pode ver o olhar de João cintilando de prazer por cada palavra que Cloe dizia a ele como se fosse um encantamento sendo proferido.
João sorriu para ela e pensou, aquilo tudo era perfeito para mim e Susan, mas, naquele momento, algo atrás de Cloe chamou a sua atenção. Ele olhou e viu uma porta com uma placa escrito “Gerência”, que estava entreaberta. No fundo, ele observou uma escuridão imensa, e sentiu uma sensação de que algo o observava.

Um arrepio passou por todo seu corpo causando um medo que nunca tinha sentido antes. Ele podia sentir os pelos dos seus braços se arrepiando a cada segundo que encarava aquela escuridão. E, por um minuto, achou que tinha uma voz na sua cabeça falando bem lentamente “SANGUE”.

 

Tentou afastar aqueles pensamentos desconfortáveis, olhou para Cloe novamente e disse:

 

— Eu liguei várias vezes hoje mais cedo, para tentar fazer a reserva, mas não consegui fazer a ligação de jeito nenhum.

 

Na mesma hora que João falou isso, Vivian bateu a mão em um potinho com algumas canetas deixando cair na bancada. João e Cloe 

 

— Eu sou a gerente! E eu gostaria que você abaixasse o tom, porque estou te tratando com todo respeito e educação, então espero o mesmo do senhor. Hoje mais cedo, uma família que está com a gente desde o final de semana passado veio até a mim e disse que ia prolongar sua estadia até esse final de semana. E eu esqueci de lançar no sistema, e não falei para nenhuma das meninas, peço desculpa pelo inconveniente, mas, se o senhor quiser os dois chalés, podemos passar sua reserva para a sexta da semana que vem — disse ela.
 

— Pelo jeito, as pessoas dessas bandas pedem muitas desculpas — disse João em um tom arrogante com um olhar fixo em Bianca. — Mas o que me deixou irritado foi essa falta de comunicação entre vocês. Enfim, pode continuar com a reserva para essa sexta, já que não tem
o que fazer.

 

— Certo, só um momento, pode ficar tranquilo que você e seus amigos vão ter toda nossa atenção — falou Bianca.

 

Houve um minuto de silêncio e a gerente proferiu:

 

— Tudo certo, João. Sua reserva está feita. O senhor tem alguma dúvida?

 

— Não! Já falei tudo que tinha que falar.

 

João desejava ficar um tempo a sós com Susan, sem o pessoal, mas não tinha o que fazer. Sandra e Christhian também queriam isso e Julia ficaria em qualquer canto. Para ela estava bom e, mesmo com esse problema, pela beleza do lugar estava valendo a pena.

 

João se afastou do balcão e foi em direção a porta, quando ouviu o telefone tocar. Foi Cloe quem atendeu:
 

— Bom dia! Chalés Monte Conver, no que posso ajudar?

 

Da porta, João olhou para trás e observou que Bianca, Cloe e Vivian estavam uma do lado da outra encarando-o como predadoras e novamente ele sentiu o medo.

 

Ele não disse nada e simplesmente voltou o mais rápido para seu carro...

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Leia o prólogo de...

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O abismo entre coração, dever e liberdade 

Ele observava ao longe, com alegria, seu pequeno Adofo, no auge dos seus cinco anos de vida, brincando serelepe no pequeno riacho que corria próximo ao Quilombo. A tarde estava quente e agradável, calma e rotineira. Aziza, sua bela esposa, seguia lavando a roupa em meio às pedras, próxima à criança.

E, então, surgiram, saindo sorrateiramente de entre a mata, os mais peçonhentos e predadores dos animais, o bicho homem. Munidos de suas foices imensas e armas ágeis e mortíferas. Ele tentou desesperadamente alcançar sua família, sem sucesso. Foi rendido em meio à sua luta corporal e resistência. Eles, aqueles homens abomináveis, caçadores de vidas, cruéis e implacáveis, renderam-no entre socos e açoites, atirando para todos os lados. Assim, impotente, com mãos e pés amarrados nas costas, assistiu a esposa e filho, todo o vigor de sua existência, sendo marcados nas costas com ferro quente, como gado, e arrastados para a mata pelos cabelos, em meio a gritos. Com uma violenta coronhada na cabeça, ele desmaiou.

Ao despertar, encontrava-se junto aos demais de sua etnia, acorrentados e assustados, sendo lavados e expostos na pior vitrine já existente. À sua frente, um nobre branco de sotaque estranho, mais parecido com um estrangeiro, cobria nariz e boca com um lenço tentando conter o mau cheiro. O então recém-desgraçado e desafortunado buscava com o olhar, por todos os cantos e rostos, sua esposa e filho, mas não os encontrou. Iniciou-se o leilão, enquanto os acorrentados analisavam suas opções, rezando e pedindo com todas as forças aos Deuses e Orixás que fossem misericordiosos ao decretarem suas sentenças.

O nobre estrangeiro observava a todos com olhar melancólico e triste, tornando-se alvo de cobiça entre os acorrentados, que o suplicavam por sua compra. Era como escolher entre o mais violento e o que batia com pena, terríveis ambas as ‘alternativas’. Entretanto, o destino sorriu naquela tarde para aquele que tudo acabara de perder. O estrangeiro o escolheu, levou-o para sua bela fazenda e proporcionando-lhe boa comida, água limpa, roupa e cama confortável, tratando-o com cordialidade e sem punições, assim como aos demais.

"Um homem bom e íntegro", muitos pensavam. Mas homens bons e íntegros não se apossam das demais vidas. Eram homens como aquele, com sua falsa moralidade, que o impediam de uma vida livre, boa e digna, era ao que ele se colocava a pensar. O então, agora, seu senhor mal ficava na fazenda, sempre viajava a trabalho, e sua ausência trazia a todos uma breve e pequena sensação de comodidade.

Ele sentia saudade da família, em certos dias, a dor era insuportável, mas não perdia a esperança de encontrá-los. Ah, ele o faria, jamais desistiria.

No decorrer dos dias na fazenda "dos sonhos", ele notou certa presença. A sinhá caminhava por ali, em seus vestidos esvoaçantes, com os cachos longos balançando ao vento. Ela caminhava em direção à mata, de cabeça erguida, sem olhar para o lado ou para baixo, e sumia. Horas mais tarde, retornava, com as madeixas molhadas. Certa tarde, um esturro assustou até mesmo os capatazes da fazenda; uma onça correu em direção ao bosque que levava à cachoeira, onde sinhá provavelmente costumava se banhar. Ele correu até ela, assustado, esperando o pior. No fim do trajeto, o já esperado tornou-se surpreendente.

Sinhá, em sua chemise branca e translúcida, nadava livremente. Ao notar seu observador, assustou-se e saiu da água quando ele lhe informou sobre o animal que ali rondava. Tropeçou, e, no instante em que ele lhe estendeu a mão, instintivamente, ocorreu o espanto do encontro para ambos, de suas peles, seu toque, seus olhares e suas almas...

Ela, com olhos que denunciavam uma mistura de surpresa e medo, encontrou apoio na mão estendida dele. A conexão instantânea entre seus mundos distintos era palpável, como se, naquele breve instante, a fazenda e o Quilombo convergissem em um único ponto de compreensão. O toque desencadeou algo mais profundo, uma ligação que ia além das convenções sociais e das correntes físicas. Naquele breve instante, eles eram apenas dois seres humanos, cada qual carregando o peso de seu próprio destino.

capítulo 1

Há quem acredite em amor à primeira vista, e há aqueles que veem o amor como uma troca de interesses. Oliver Sinclair, um rico Ministro Plenipotenciário britânico recém-chegado ao Brasil, procurava, naquela festiva noite de ano novo, uma dama não apenas de família abastada em riquezas, mas também dona de uma certa aparência decente. Segundo ele, um casamento não necessariamente precisava ser um negócio integral; ele teria de se unir a essa dama, ter filhos com ela, então suas exigências não eram particularmente extravagantes. No mínimo, ela deveria ter dentes bonitos, boa aparência e certo requinte.

Oliver observava minuciosamente cada moça presente no baile de carnaval, da mesma forma que todas o observavam, na esperança de saírem dali comprometidas em um matrimônio bem-sucedido. Estava muito longe de casa, porém a sociedade brasileira se assemelhava-se um pouco a europeia em alguns aspectos: nas mesmas vestimentas, nos princípios, nas jovens recatadas com suas mães ávidas por um bom acordo de casamento, embora todos ali devessem melhorar seus modos. Oliver não opinava a esse respeito, afinal era apenas mais um hóspede de seu tio materno, Charles Evans, que há muito viera para o Brasil com o objetivo de consolidar suas riquezas casando-se com Célia, filha dos donos de importantes minas de minérios, diamantes e ouro.

No salão, moças rodopiavam com seus imensos vestidos e cabelos adornados em penteados bem elaborados. No entanto, do lado oposto da festa, uma jovem em particular estava melancólica, observando o lado de fora pela janela e demonstrando completo desinteresse pela celebração. Seu cabelo estava semipreso por uma delicada tiara, deixando os cachos bem modulados e escuros caírem sobre suas costas. Vestia um traje com a saia cheia de camadas em tom azul-claro, com rendas no alto do corpete, revelando sutilmente os ombros e exibindo uma pele clara, não tão pálida quanto o leite, mas atraentemente clara como uma flor de cerejeira.

Ela havia despertado a curiosidade de Oliver. Embora ele tenha sido apresentado e bajulado por todas as jovens presentes, não conseguia se lembrar de uma donzela tão bela e distraída. Seu rosto, assim como sua silhueta, vista de trás, poderia ser suficiente para convencer Oliver a reconsiderar suas exigências quanto à riqueza de sua futura amada, caso ela não fosse tão abastada. Ele começou a caminhar em direção à jovem, contudo, Célia, a anfitriã do sarau, aproximou-se dela quando Oliver já estava no meio do caminho. Cochichando em seu ouvido em seguida guiando-a para o centro do salão, onde todos dançavam, avistando Oliver, e levando-a até ele.

— Oliver, querido, permita-me apresentar minha sobrinha, Srta. Magnólia Moraes, filha de minha irmã casada com o fazendeiro e importador de café, o Marquês de Montenegro, Benedito Moraes — exclamou Célia com certa empolgação. Certamente, ela estava encarregada de casar sua sobrinha com alguém de seu nível, e para Oliver, isso era mais do que interessante. "Então, assim é seu rosto," pensou Oliver, encantado com a jovem de olhos escuros, bochechas rosadas e olhar tímido à sua frente.

— É uma honra conhecê-la, Srta. Moraes — declarou Oliver com um leve sotaque estrangeiro, enquanto beijava a mão enluvada da jovem, desejando imediatamente iniciar as negociações de matrimônio. Quando Célia passou alguns anos em Londres, com Charles, ela se encarregou de ensinar a Oliver sua língua nativa. Em troca, Oliver também a ensinava a aprimorar o sotaque britânico, já que Célia almejava ser bem aceita na sociedade londrina, e Oliver estava interessado em encontrar formas de adquirir fortuna na terra do pau-brasil, repleta de riqueza em solo, territórios e minérios.

Oliver, apesar de criado e cuidado por uma família rica e importante, viera de origens simples, já que sua mãe, quando jovem, fugiu com seu grande amor, numa união desaprovada pela família devido à baixa classe do rapaz. A mãe de Oliver faleceu durante seu parto, e seu pai, sem condições, o entregou aos avós maternos, que o criaram de forma íntegra e confortável. Ele frequentou sempre as melhores escolas e teve acesso a tudo de melhor que Londres tinha a oferecer. No entanto, Oliver carregava o sobrenome de seu pai, o que o desqualificava como herdeiro da família, tendo em vista que seu tio Charles vinha à frente como o filho homem mais velho de seus avós. Desde cedo, Oliver desenvolveu um interesse no estudo de finanças, diplomacia e, principalmente, especializou-se em idiomas estrangeiros como francês, espanhol e, graças às aulas de Célia, português. Com a ajuda e influência de seu tio, logo foi introduzido à nobreza e diplomacia, servindo, agora, diretamente à regência vitoriana.

— Ela está passando um tempo conosco aqui no Rio de Janeiro. Minha irmã Eugênia e o Marquês me encarregaram de sua educação, seguindo os padrões europeus, é claro. Inclusive, ela recebeu boas aulas de dança, que a tornaram uma parceira à altura de um príncipe para uma contradança — propagou Célia.

— Sendo assim, acredito que a próxima dança seja minha. — Oliver curvou-se estendendo a mão para a jovem. Ela respondeu com uma impecável reverência, aceitando o convite e segurando sua mão. Em seguida, juntaram-se aos demais casais para uma romântica valsa que havia acabado de começar. Oliver pôs uma mão em sua cintura, enquanto a outra erguia seu braço.

— Magnólia, nome belo como a flor, combina com você — pontuou, fitando-a nos olhos. Ela enrubesceu, constrangida.

— Podemos conversar no seu idioma, se preferir. Aqui na casa da Tia Célia, nos comunicamos em inglês por causa do Tio Charles, e também para parecermos ainda mais nobres; até mesmo os cativos foram ensinados — respondeu ela em um sotaque britânico quase perfeito.

— Impressionante. Você acabou de colocar todas as demais jovens aqui presentes no mesmo patamar de seus pés. Célia está fazendo um bom trabalho com você. Mas gosto de apreciar e respeitar o idioma nativo dos países que visito; além disso, é uma excelente forma de exercitar a língua.

— Agradeço o elogio, Sir Sinclair.

— Por favor, me chame apenas de Oliver. Algo me diz que não precisaremos de tamanha formalidade entre nós, com todo o respeito, é claro.

Os olhos de Magnólia encontraram os de Oliver escandalizados.

— Se me permite, quero conhecê-la melhor. Gostaria que nos tornássemos bons amigos, por enquanto. — Ele imediatamente se corrigiu, em um meio sorriso, procurando demonstrar o interesse que ela o despertara logo à primeira vista. — Célia disse que você está passando uma temporada aqui. Quanto tempo mais pretende ficar?

— Devo voltar para casa em dois dias, senhor. — Ela baixou o olhar e continuou: — Já estou aqui há um ano. Foi tempo mais que suficiente para aprimorar meus talentos e ser digna de um nobre. Meus pais se iludem com isso.

— E você não se considera capaz de conquistar um nobre? Devo dizer, Srta. Moraes, se estivéssemos em Londres, deixaria qualquer duque ou visconde de joelhos diante de tamanha beleza e educação impecável — disse ele, aproximando Magnólia e puxando-a pela cintura.

Oliver era um libertino nato, conquistador de jovens viúvas que não temiam a opressão da sociedade. Nos clubes e bordéis, as cortesãs se rendiam ao charme sedutor do eloquente Oliver. Sua aparência, também, era uma qualidade à parte: alto, ombros largos, forte, pele clara, cabelos negros bem cortados, sobrancelhas escuras e grossas e um olhar penetrante, capaz de ler a mente de alguém.

Oliver sentiu que Magnólia enrijeceu ao seu toque quando repousou uma mão em suas costas, próximo ao quadril. Era evidente que ela viera de uma criação casta que a privou de qualquer contato físico ou carnal, um fato que apenas aguçou o interesse de Oliver. Ele estava determinado a encontrar uma esposa naquele ano.

— O senhor me constrange, peço que por gentileza não tome tais liberdades comigo — advertiu, estampando uma expressão séria, enquanto recuava um passo e erguia o braço de Oliver, retirando-o de sua lombar e colocando-o mais acima em suas costas.

— Perdoe-me, não quero ofender, apenas enaltecer. Estou encantado pela senhorita. Fale-me mais sobre sua família.

— Bem, não há tanto o que dizer além do óbvio, meu pai é dono de uma grande e importante fazenda de café em Minas Gerais. Ele conquistou notoriedade no ramo ao se casar com minha mãe, que também era filha mais velha de um cafeicultor. Após a morte de meu avô, ele uniu suas posses à herança de mamãe e se tornou um grande agricultor e exportador. Com sua influência e soberania na região, chamou a atenção do Imperador, que, durante uma visita às nossas terras, lhe concedeu o Título de Marquês de Montenegro.

— Em uma terra rica em pedras preciosas e ouro, seu pai escolheu o plantio?

— Já foi uma região rica em minérios, mas hoje é fértil. O café é o novo ouro.

— O Ouro Negro — concordou Oliver.

A valsa foi interrompida por Charles, o anfitrião, que bateu numa taça com um talher e falou:

— Muito bem, senhoras e senhores, é chegada a hora da contagem regressiva. Convido a todos para irem até nossas sacadas, onde apreciarão uma majestosa queima de fogos preparada por nós, vinda diretamente da praia.

Um forte som de aplausos e euforia tomou conta do ambiente.

— A senhorita me acompanha? — perguntou Oliver.

— Claro — respondeu timidamente.

Os dois caminharam até a varanda junto aos demais, e ali iniciaram a contagem, até que enfim os céus foram iluminados por um arco-íris de cores brilhantes. Oliver tomou a mão de Magnólia, retirando sua luva lentamente e beijando-a em seguida. Ela parou de respirar por um instante quando sentiu o toque de seus lábios quentes e úmidos.

[1]Happy New Year, Miss Moraes. — Ele a fitou profundamente.

[2]Happy New Year, Sir Sinclair. — Ela podia sentir o rubor em sua pele.

— Pode me conceder mais uma dança?

— Vamos deixar para outra oportunidade. Estou cansada e pedirei permissão para me deitar. — Ela permanecia com o olhar e a expressão impactados.

Pela experiência de Oliver, notava-se que ela não teve tanto contato social com muitas pessoas. Ela transparecia bastante insegurança, o tempo todo alerta em uma postura impecável, como se temesse tropeçar nas palavras ou cometer alguma gafe impagável. A festividade deveria estar sendo uma tortura para a jovem introvertida.

— Mas agora que a meia-noite chegou, a festa, pelo visto, seguirá até ao amanhecer. Eu gostaria de apreciar um pouco mais sua companhia. Fui muito insolente?

Ela abriu um sorriso tímido, finalmente voltando seu olhar acolhedor aos olhos perspicazes de Oliver.

— De forma alguma. O senhor é um cavalheiro, diferente dos demais da região. Apenas acredito que podemos guardar mais para outras ocasiões. O senhor ficará hospedado aqui, certo?

— Bem, acredito que sim. Eu não conheço mais ninguém além de tio Charles e Célia, tampouco pretendo passar a noite em uma pousada.

— Então nos veremos pela manhã durante o desjejum. Foi uma honra conhecê-lo, senhor.

— A honra foi toda minha — declarou em tom sombrio, beijando a mão de Magnólia, enquanto a encarava seriamente, mantendo o olhar firme. A moça corou um pouco, fez uma singela reverência e se retirou do salão.

Oliver a observou enquanto saía. Ela era absolutamente linda, educada e vinda de uma família nobre e rica. Um pacote completo, muito além das exigências de Oliver. Durante a dança, ele não pôde deixar de notar o quanto o corpete do vestido valorizava seus seios redondos e protuberantes. Também não pôde deixar de perceber o aroma de lavanda que ela exalava. Ele sonharia com aqueles seios e aquele cheiro...

Além disso, Oliver notou que Magnólia, apesar de linda, não tinha a aparência jovem das moças de quatorze ou quinze anos. Ela aparentava ser mais madura, por volta de uns vinte e dois ou vinte e quatro anos, o que para Oliver era ainda mais excitante, já que ele era um tanto impaciente com as meninas imaturas que debutavam na sociedade.

Uma certeza ele adquiriu naquela noite: sua busca terminara. Oliver se casaria com aquela mulher e a possuiria de todas as formas que sua imaginação permitisse.

 

~

 

 

Magnólia deixou o salão com certo pesar. Suas expectativas para aquela noite eram minimamente baixas, ela reconhecia que já havia passado da hora de se casar. Qualquer proposta que agradasse a seu pai a tornaria esposa de algum rico fazendeiro, e ela não tinha escolha nesse assunto.

Houve um tempo em que ela se frustrava com tal fato. Ansiava ter as mesmas sensações que as demais jovens, dançar a noite toda, ir às modistas, à feira da cidade... Ter a oportunidade de escolher o marido por aquilo que a agradasse e mais ninguém. Jamais compreendeu a razão pela qual o pai a privava dos cortejos galantes ou da aproximação de qualquer cavalheiro; ele a escondia, como um dragão zela por seu tesouro.

Quando Magnólia desabrochou, tornando-se moça, suas curvas delinearam-se, e sua aparência delicada fez jus à sua postura gentil e submissa, sempre obediente e cordial ao pai, não por respeito, mas talvez por medo ao homem imponente e cruel que governava sua casa e sua vida, ela despertou demasiado interesse em diversos pretendentes. Era compreensível as exigências do Marquês quanto à filha, esperando que algo melhor ainda estivesse por vir, alguém digno o suficiente para se apossar das abundantes riquezas e de sua pacata inocência. Era isso que todos ao redor da família pensavam, não haveria outra razão para tal posicionamento, haveria?

Porém, o tempo se mostrou um oponente à altura de Benedito. Rápido como um cavalo de corrida, os anos passaram, e Magnólia, no auge de seus vinte e cinco anos, para muitos não era mais uma moça, mas sim uma solteirona. Isso a levou a obrigar-se a aceitar que estava fadada a tornar-se nada além de uma alma conformada, tendo seu destino sempre traçado por aquilo que decidissem por ela, como era de costume naquele tempo. Ela guardou suas vontades e desejos dentro de si, tão bem escondidos, a ponto de serem esquecidos até mesmo por ela em longos instantes, nada mais tinha a fazer além de aceitar o martírio de ser mulher. Talvez a isso se deva a atitude desesperada da mãe, em mandá-la para a casa dos tios na corte.

O que nos trás a aquela noite, durante a dança com Sir Oliver Sinclair, Magnólia se viu pela primeira vez em muito tempo imaginando o que escolheria para si, se pudesse. Certamente, em termos de aparência, Oliver parecia ser um excelente padrão. Ela se perguntava como seriam as ideias desse nobre cavalheiro. Talvez devesse ter ficado um pouco mais, aceitado o convite e dançado a próxima música. Mas Magnólia não se permitiria frustrar-se com expectativas tão elevadas, já vira esse enredo repetir-se constantemente, vez ou outra chegavam aos seus ouvidos, fofocas de nobres estrangeiros, que arruinavam pobres moças do campo com suas promessas e juras de amor e desapareciam em seguida. Homens como Oliver, de tal posição, não abdicavam de suas vidas na corte inglesa para se casar com solteiras do campo desprovidas de modos e requinte europeu. E, quando o faziam, era apenas por interesse em suas riquezas, garantindo logo um herdeiro e deixando a esposa para voltar aos bordéis e clubes ingleses.

Magnólia sabia que, por ser mulher, estava fadada a um casamento infeliz e repugnante, seu conforto era a certeza de que ao menos da violência estaria segura, seu pai jamais admitiria casá-la com um homem agressivo. Portanto, afastar-se da excitante companhia de Sir Oliver significava também evitar a possível decepção de ser cortejada apenas como uma distração durante sua estadia. Magnólia estava determinada a evitá-lo pelo tempo que fosse necessário enquanto permanecesse na casa de Célia.

Ao chegar a seus aposentos, solicitou um banho e dispensou sua aia, pois precisava de privacidade para aliviar a tensão que a assolara durante a noite. Apesar de ter sido apenas uma dança, Magnólia não conseguia esquecer o olhar penetrante de Sir Oliver; ela sentira-se completamente desnudada perante aqueles olhos escuros e intensos. Talvez a conduta radical de seu pai quanto às suas privações não fossem totalmente erradas. Se com apenas uma valsa Oliver já teve um efeito tão significativo sobre ela, imagine se tivesse desfrutado dessa liberdade por mais tempo. Ser cautelosa também era um dos seus dons dos quais ela se orgulhava. Ela ainda podia sentir as mãos grandes que envolveram sua cintura e, depois, sua lombar, lembranças essas que não escapariam de sua memória, seu primeiro contato a um homem. Mesmo com todas as camadas de tecido do vestido e do corset, o caloroso toque dele causou arrepios em sua espinha.

Naquela época, a expressão da sexualidade e dos estressantes hormônios na mulher era considerada uma doença, frequentemente rotulada como "histeria feminina". O sexo era visto estritamente como um ato para a procriação, no qual beijos e carícias não eram permitidos. A mulher deveria permanecer imóvel, deitada sobre o leito, com os braços e pernas sobre o colchão, enquanto o marido realizava o ato. Qualquer movimento ou carícia era considerado pecaminoso, podendo levar à loucura do marido e à condenação de sua alma e da esposa. Como penitência, a mulher deveria buscar confissão na igreja e cumprir uma dura e rigorosa série de orações. No entanto, muitos homens tomavam liberdades com suas esposas e depois as culpavam e envergonhavam.

 

Magnólia se viu perturbada pelo toque de Sir Oliver e por seu aroma de cravos e canela, algo que ela nunca havia experimentado antes com ninguém. Ela se preocupou com as impressões que sua proximidade a um homem, publicamente, pudesse causar na sociedade, quando Oliver a puxou para mais perto durante a dança, tão próxima que suas respirações chegaram a se misturar e o hálito quente de Sir Sinclair tocou sua face. Ela jamais esteve tão íntima com alguém.

Quando finalmente se despiu e imergiu na banheira, tentou afastar os pensamentos perturbadores, mas a imagem de Oliver continuou a assombrá-la, despertando desejos perigosos. Ela fora criada para ser uma dama de bem, uma boa esposa, e temia que tais ações obscenas, como tocar o próprio corpo, mesmo que em sua extrema privacidade, pudessem trazer sérias consequências. Ela balançou a cabeça, afastando os pensamentos sujos.

— Recomponha-se, Magnólia — advertiu.

Ao sair da banheira, ainda atordoada, Magnólia se enxugou e vestiu uma chemise, deitando-se sobre os lençóis de seda estendidos na cama, esforçando-se para dormir, porém, a música vinda do salão ainda tocava ao fundo.

Ela enfrentaria uma longa noite de insônia com seus pensamentos inquietantes.

 

[1] Feliz Ano Novo, Senhorita Moraes.

[2] Feliz Ano Novo, Sir Sinclair.

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